Pode-se provar a existência de Deus por cinco vias:
1) A primeira via parte do movimento.
A) Tudo o que se move é movido por outro.
• Nada se move que não esteja em potência em relação ao termo de seu movimento.
• Ao contrário, o que move o faz enquanto se encontra em ato.
• Portanto, mover nada mais é do que levar algo da potência ao ato, e nada pode ser levado ao ato senão por um ente em ato.
Exemplo: O fogo (quente em ato) torna a madeira, que está em potência para o calor, quente em ato, e assim a move e altera.
• Ora, não é possível que a mesma coisa, considerada sob o mesmo aspecto, esteja simultaneamente em ato e em potência.
Exemplo: o que está quente em ato não pode estar simultaneamente quente em potência, mas está frio em potência.
• É impossível que sob o mesmo aspecto e do mesmo modo algo seja motor e movido, ou que mova a si próprio. É preciso que tudo o que se move seja movido por outro.
B)
• Assim, se o que move é também movido, o é necessariamente por outro, e este por outro ainda.
• Ora, não se pode continuar até o infinito, pois neste caso não haveria um primeiro motor, por conseguinte, também outros motores, pois os motores segundos só se movem pela moção do primeiro motor.
• Então, é necessário chegar a um primeiro motor, não movido por nenhum outro, e este é Deus.
2) A segunda via parte da razão de causa eficiente.
• Nas realidades sensíveis encontramos a existência de uma ordem entre as causas eficientes, mas não encontramos algo que seja causa eficiente de si próprio, pois desse modo teria de ser anterior a si próprio, o que é impossível.
• Tampouco é possível, entre as causas eficientes ordenadas, continuar até o infinito, pois:
• Entre todas as causas eficientes ordenadas, a primeira é a causa das intermediárias, e estas a causa da última.
• Supressa a causa, suprime-se também o efeito. Portanto, sem a causa primeira não haveria a intermediária e nem a última.
• Ora, numa seqüência infinita, não haveria causa primeira, e, portanto, não haveria efeito último e nem causa intermediária.
• Logo, é necessário afirmar uma causa eficiente primeira, o que é chamado de Deus.
3) A terceira via é tomada do possível e do necessário.
• Encontramos, entre as coisas, as que podem ser ou não ser, uma vez que algumas nascem (pela geração, elas são) e perecem (pela corrupção, deixam de ser, não são mais).
• Mas é impossível ser para sempre o que é de tal natureza: o que pode não ser, não é em algum momento (o que é eterno não pode não ser). Ou seja, o que pode não-ser necessariamente deve ter sido gerado, e aquilo que foi gerado, começou a partir do não-ser.
• Se é verdade que tudo pode não ser, pode ter havido um momento em que nada havia, mas então nada hoje existiria, pois o que não é só passa a ser por intermédio de algo que já é. É necessário, pois, que sempre algo seja.
• Assim, nem todos os entes são possíveis, mas é preciso que algo seja necessário entre as coisas, e tudo o que é necessário tem, ou não, a causa de sua necessidade de um outro.
• Aqui também não é possível continuar até o infinito na série das coisas necessárias que tem uma causa da própria necessidade, como acontece entre as causas eficientes (2ª via).
• Portanto, é necessário afirmar a existência de algo necessário por si mesmo, que não encontra em outro lugar a causa de sua necessidade, mas que é causa da necessidade para os outros: o que chamamos Deus*.
* Nota da Suma Ed. Loyola: “O que pode não ser não é em algum momento”: a dificuldade da demonstração está nessa afirmação, que parece ser o seu pivô, mas que não é de modo algum evidente. É preciso observar, em primeiro lugar, que Sto. Tomás fala aqui expressamente dos seres submetidos à geração e à corrupção, e aí o seu princípio é incontestável: tudo o que vem a existir pela geração, e deixa de fazê-lo por corrupção, começou a partir do não-ser. Contudo, isto lhe dá o direito de prosseguir: “Se tudo pode não ser, em um dado momento não havia nada”? O que é verdade para cada ser corruptível é verdadeiro para a sua totalidade? Sto. Tomás não aceitou tal conseqüência, já que ele admite, com Aristóteles, que o universo poderia ter sido sempre. Na verdade, ele não se contradiz, pois é no próprio coração do universo composto de entes corruptíveis que descobrimos a necessidade: necessidade das essências, necessidade (relativa) das leis físicas, necessidade do próprio ser, pois o que é, por contingente que seja, não pode simultaneamente não ser. Todavia, nessa demonstração, que como as quatro outras é muito reduzida, Sto. Tomás prefere passar dos seres corruptíveis, cuja contingência é manifesta, aos entes incorruptíveis – os puros espíritos, também os astros, de acordo com a cosmologia de sua época. Estes entes incorruptíveis são necessários, mas sua necessidade não tem o seu princípio em si mesmos: é causada, encontra-se na dependência de um Necessário anterior a ela, o qual, por sua vez, deve sua necessidade a um outro, depende deste de tal maneira que, caso não haja um Ser necessário por si mesmo, princípio de toda a necessidade que encontramos no universo, tudo é contingente. Não é verdade, no entanto, que tudo seja contingente, pois a existência dos entes incorruptíveis é dotada de necessidade, como vimos. Além disso, toda existência, de fato, comporta uma certa necessidade, de modo que poderíamos ter demonstrado a existência do Necessário por si a partir unicamente dos seres incorruptíveis.
4) A quarta via se toma dos graus que se encontram nas coisas.
• Encontra-se nas coisas algo mais ou menos bom, mais ou menos verdadeiro, mais ou menos nobre, etc.
• Ora, mais e menos se dizem de coisas diversas conforme elas se aproximam diferentemente daquilo que é em si o máximo. Existe, pois, em grau supremo algo verdadeiro, bom, nobre e, conseqüentemente, o ente em grau supremo (como se mostra no livro II da Metafísica, o que é em sumo grau verdadeiro, é ente em sumo grau). Assim, mais quente é o que mais se aproxima do que é sumamente quente.
• Por outro lado, o que se encontra no mais alto grau em determinado gênero é causa de tudo que é desse gênero (idem: Metafísica, livro II): assim o fogo, que é quente, no mais alto grau, é causa do calor de todo e qualquer corpo aquecido.
• Existe então algo que é, para todos os outros entes, causa de ser, de bondade e de toda a perfeição: nós o chamamos Deus*.
* Nota da Suma Ed. Loyola: O exemplo do fogo nos deixa embaraçados. Deve-se ver nele uma ilustração, muito eficaz para os contemporâneos de Sto. Tomás, que viam no fogo um corpo no qual se realizava o calor absoluto, mas inoperante para nós. Contudo, não se trata de um argumento cuja evidente não-pertinência invalide toda a argumentação. De maneira tão condensada que o seu procedimento permanece obscuro, tal raciocínio evoca o grande tema metafísico da participação, que não provém de Aristóteles, mas de Platão, e que, profundamente remodelado pela introdução da causalidade eficiente e da limitação do ato pela potência – estas sim provenientes de Aristóteles -, está no centro da metafísica de Sto. Tomás. O calor é uma qualidade material, cujo grau de intensidade provém da quantidade: e sabemos muito bem que a série dos números pode prolongar-se indefinidamente sem que encontremos um número que seja o primeiro. Uma qualidade espiritual não resolveria o problema, pois o mais ou o menos, o grau de intensidade, não podem ser tomados em relação a um primeiro no qual essa qualidade seria ilimitada, toda qualidade estando limitada em sua perfeição ontológica devido ao fato de ela ser um acidente. Mas, os valores que a demonstração leva em consideração são atributos da própria essência dos seres, assim como de seus acidentes. Ora, a própria essência exclui o mais ou o menos. É preciso portanto, se ela for mais ou menos verdadeira, boa, bela... que seja por comparação com uma essência que seja a verdade, a bondade, a beleza... e tudo isso ao infinito e absolutamente. Todos esses valores, que são recebidos nos entes que conhecemos, e devido a isso limitados, só podem derivar, por causalidade, daquele do qual constituem a essência. Os entes nos quais os encontramos parcialmente realizados participam de tais valores e participam daquele no qual elas se realizam plenamente, ou seja, infinitamente.
5) A quinta via se toma do governo das coisas.
• Algumas coisas que carecem de conhecimento, como os corpos físicos, agem em vista de um fim, visto que sempre, ou na maioria das vezes, agem da mesma maneira, a fim de alcançarem o que é ótimo.
• Fica claro que não é por acaso, mas em virtude de uma intenção, que alcançam o fim.
• Ora, como pode algo que não tem conhecimento tender a um fim, a não ser dirigido por algo que conhece e que é inteligente?
• Logo, existe algo inteligente pelo qual todas as coisas naturais são ordenadas, e que nós chamamos Deus.
Suma Teológica - Santo Tomáz de Aquino
1) A primeira via parte do movimento.
A) Tudo o que se move é movido por outro.
• Nada se move que não esteja em potência em relação ao termo de seu movimento.
• Ao contrário, o que move o faz enquanto se encontra em ato.
• Portanto, mover nada mais é do que levar algo da potência ao ato, e nada pode ser levado ao ato senão por um ente em ato.
Exemplo: O fogo (quente em ato) torna a madeira, que está em potência para o calor, quente em ato, e assim a move e altera.
• Ora, não é possível que a mesma coisa, considerada sob o mesmo aspecto, esteja simultaneamente em ato e em potência.
Exemplo: o que está quente em ato não pode estar simultaneamente quente em potência, mas está frio em potência.
• É impossível que sob o mesmo aspecto e do mesmo modo algo seja motor e movido, ou que mova a si próprio. É preciso que tudo o que se move seja movido por outro.
B)
• Assim, se o que move é também movido, o é necessariamente por outro, e este por outro ainda.
• Ora, não se pode continuar até o infinito, pois neste caso não haveria um primeiro motor, por conseguinte, também outros motores, pois os motores segundos só se movem pela moção do primeiro motor.
• Então, é necessário chegar a um primeiro motor, não movido por nenhum outro, e este é Deus.
2) A segunda via parte da razão de causa eficiente.
• Nas realidades sensíveis encontramos a existência de uma ordem entre as causas eficientes, mas não encontramos algo que seja causa eficiente de si próprio, pois desse modo teria de ser anterior a si próprio, o que é impossível.
• Tampouco é possível, entre as causas eficientes ordenadas, continuar até o infinito, pois:
• Entre todas as causas eficientes ordenadas, a primeira é a causa das intermediárias, e estas a causa da última.
• Supressa a causa, suprime-se também o efeito. Portanto, sem a causa primeira não haveria a intermediária e nem a última.
• Ora, numa seqüência infinita, não haveria causa primeira, e, portanto, não haveria efeito último e nem causa intermediária.
• Logo, é necessário afirmar uma causa eficiente primeira, o que é chamado de Deus.
3) A terceira via é tomada do possível e do necessário.
• Encontramos, entre as coisas, as que podem ser ou não ser, uma vez que algumas nascem (pela geração, elas são) e perecem (pela corrupção, deixam de ser, não são mais).
• Mas é impossível ser para sempre o que é de tal natureza: o que pode não ser, não é em algum momento (o que é eterno não pode não ser). Ou seja, o que pode não-ser necessariamente deve ter sido gerado, e aquilo que foi gerado, começou a partir do não-ser.
• Se é verdade que tudo pode não ser, pode ter havido um momento em que nada havia, mas então nada hoje existiria, pois o que não é só passa a ser por intermédio de algo que já é. É necessário, pois, que sempre algo seja.
• Assim, nem todos os entes são possíveis, mas é preciso que algo seja necessário entre as coisas, e tudo o que é necessário tem, ou não, a causa de sua necessidade de um outro.
• Aqui também não é possível continuar até o infinito na série das coisas necessárias que tem uma causa da própria necessidade, como acontece entre as causas eficientes (2ª via).
• Portanto, é necessário afirmar a existência de algo necessário por si mesmo, que não encontra em outro lugar a causa de sua necessidade, mas que é causa da necessidade para os outros: o que chamamos Deus*.
* Nota da Suma Ed. Loyola: “O que pode não ser não é em algum momento”: a dificuldade da demonstração está nessa afirmação, que parece ser o seu pivô, mas que não é de modo algum evidente. É preciso observar, em primeiro lugar, que Sto. Tomás fala aqui expressamente dos seres submetidos à geração e à corrupção, e aí o seu princípio é incontestável: tudo o que vem a existir pela geração, e deixa de fazê-lo por corrupção, começou a partir do não-ser. Contudo, isto lhe dá o direito de prosseguir: “Se tudo pode não ser, em um dado momento não havia nada”? O que é verdade para cada ser corruptível é verdadeiro para a sua totalidade? Sto. Tomás não aceitou tal conseqüência, já que ele admite, com Aristóteles, que o universo poderia ter sido sempre. Na verdade, ele não se contradiz, pois é no próprio coração do universo composto de entes corruptíveis que descobrimos a necessidade: necessidade das essências, necessidade (relativa) das leis físicas, necessidade do próprio ser, pois o que é, por contingente que seja, não pode simultaneamente não ser. Todavia, nessa demonstração, que como as quatro outras é muito reduzida, Sto. Tomás prefere passar dos seres corruptíveis, cuja contingência é manifesta, aos entes incorruptíveis – os puros espíritos, também os astros, de acordo com a cosmologia de sua época. Estes entes incorruptíveis são necessários, mas sua necessidade não tem o seu princípio em si mesmos: é causada, encontra-se na dependência de um Necessário anterior a ela, o qual, por sua vez, deve sua necessidade a um outro, depende deste de tal maneira que, caso não haja um Ser necessário por si mesmo, princípio de toda a necessidade que encontramos no universo, tudo é contingente. Não é verdade, no entanto, que tudo seja contingente, pois a existência dos entes incorruptíveis é dotada de necessidade, como vimos. Além disso, toda existência, de fato, comporta uma certa necessidade, de modo que poderíamos ter demonstrado a existência do Necessário por si a partir unicamente dos seres incorruptíveis.
4) A quarta via se toma dos graus que se encontram nas coisas.
• Encontra-se nas coisas algo mais ou menos bom, mais ou menos verdadeiro, mais ou menos nobre, etc.
• Ora, mais e menos se dizem de coisas diversas conforme elas se aproximam diferentemente daquilo que é em si o máximo. Existe, pois, em grau supremo algo verdadeiro, bom, nobre e, conseqüentemente, o ente em grau supremo (como se mostra no livro II da Metafísica, o que é em sumo grau verdadeiro, é ente em sumo grau). Assim, mais quente é o que mais se aproxima do que é sumamente quente.
• Por outro lado, o que se encontra no mais alto grau em determinado gênero é causa de tudo que é desse gênero (idem: Metafísica, livro II): assim o fogo, que é quente, no mais alto grau, é causa do calor de todo e qualquer corpo aquecido.
• Existe então algo que é, para todos os outros entes, causa de ser, de bondade e de toda a perfeição: nós o chamamos Deus*.
* Nota da Suma Ed. Loyola: O exemplo do fogo nos deixa embaraçados. Deve-se ver nele uma ilustração, muito eficaz para os contemporâneos de Sto. Tomás, que viam no fogo um corpo no qual se realizava o calor absoluto, mas inoperante para nós. Contudo, não se trata de um argumento cuja evidente não-pertinência invalide toda a argumentação. De maneira tão condensada que o seu procedimento permanece obscuro, tal raciocínio evoca o grande tema metafísico da participação, que não provém de Aristóteles, mas de Platão, e que, profundamente remodelado pela introdução da causalidade eficiente e da limitação do ato pela potência – estas sim provenientes de Aristóteles -, está no centro da metafísica de Sto. Tomás. O calor é uma qualidade material, cujo grau de intensidade provém da quantidade: e sabemos muito bem que a série dos números pode prolongar-se indefinidamente sem que encontremos um número que seja o primeiro. Uma qualidade espiritual não resolveria o problema, pois o mais ou o menos, o grau de intensidade, não podem ser tomados em relação a um primeiro no qual essa qualidade seria ilimitada, toda qualidade estando limitada em sua perfeição ontológica devido ao fato de ela ser um acidente. Mas, os valores que a demonstração leva em consideração são atributos da própria essência dos seres, assim como de seus acidentes. Ora, a própria essência exclui o mais ou o menos. É preciso portanto, se ela for mais ou menos verdadeira, boa, bela... que seja por comparação com uma essência que seja a verdade, a bondade, a beleza... e tudo isso ao infinito e absolutamente. Todos esses valores, que são recebidos nos entes que conhecemos, e devido a isso limitados, só podem derivar, por causalidade, daquele do qual constituem a essência. Os entes nos quais os encontramos parcialmente realizados participam de tais valores e participam daquele no qual elas se realizam plenamente, ou seja, infinitamente.
5) A quinta via se toma do governo das coisas.
• Algumas coisas que carecem de conhecimento, como os corpos físicos, agem em vista de um fim, visto que sempre, ou na maioria das vezes, agem da mesma maneira, a fim de alcançarem o que é ótimo.
• Fica claro que não é por acaso, mas em virtude de uma intenção, que alcançam o fim.
• Ora, como pode algo que não tem conhecimento tender a um fim, a não ser dirigido por algo que conhece e que é inteligente?
• Logo, existe algo inteligente pelo qual todas as coisas naturais são ordenadas, e que nós chamamos Deus.
Suma Teológica - Santo Tomáz de Aquino
Visitei o seu blog e gostei. Seria uma honra se visitasse o meu desse sua impressão. Caso você goste podemos até fazer uma parceria. Graça e Paz. http://martins125.blogspot.com/
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